Cienc. Cult. vol.59 no.2 São Paulo Apr./June 2007
DIREITOS HUMANOS
Violência contra crianças está presente em qualquer classe social
"Estudos sistemáticos de organismos internacionais e instituições brasileiras buscam qualificar, quantificar e fornecer parâmetros para que políticas públicas se tornem eficientes no combate à violência contra crianças e adolescentes. As agressões sofridas, sejam de ordem moral, física e sexual, acontecem nos ambientes mais diversos, desde ações "disciplinadoras" de escolas ou instituições de abrigo, intimidação e discriminação dos próprios colegas, coações no trabalho, abusos em casa ou situações de risco, como o tráfico e a pornografia. As conseqüências na formação e na vida futura desses jovens, desde falta de perspectivas como traumas profundos, são objeto de muita pesquisa e trabalho acadêmico.
Todas essas atitudes desumanas fazem parte do cotidiano de milhões de crianças, sejam elas ricas ou pobres. "O que se verifica é que, freqüentemente, se associa pobreza e maus tratos, atribuindo à condição de baixa renda ações de negligência e violência. Na realidade, famílias pobres encontram-se mais vulneráveis a serem denunciadas, o que não significa que casos de maus-tratos sejam exclusivos dessa faixa social; a questão é que, em famílias de classe média e alto poder aquisitivo, tudo é ocultado". Para a pesquisadora Zélia Maria Mendes Biasoli Alves, do Departamento de Psicologia e Educação da USP de Ribeirão Preto, em qualquer classe social a vergonha e o medo, tanto das crianças como de seus pais - no caso de o agressor ser um cônjuge, parente, empregador, policial ou um líder comunitário - são fatores que ajudam a camuflar o problema.
Um recente estudo das Nações Unidas sobre o tema, sob coordenação do pesquisador da USP, Paulo Sérgio Pinheiro, mostra que "a violência ainda prevalece em todos os países do mundo e está presente em qualquer cultura, classe, nível de escolaridade, faixa de renda e origem étnica. Em várias regiões, a violência contra crianças é um fenômeno aprovado e, freqüentemente, legal ". Em pelo menos 106 países não se proíbe o uso de castigos corporais nas escolas, 147 países não os proíbem em instituições assistenciais alternativas e somente 16 países os proibiram no lar até hoje.
Em muitos países, a legislação se concentra em penalidades contra a violência sexual ou física praticada contra crianças, não levando em consideração a violência psicológica nem medidas de prevenção, recuperação e reintegração. "Os esforços para atacar a questão da violência contra crianças são freqüentemente reativos e concentrados nos seus sintomas e conseqüências, e não em suas causas. As estratégias tendem a ser fragmentadas e recursos insuficientes são alocados para medidas concebidas para atacar o problema. Além disso, os compromissos internacionais de proteger crianças da violência, freqüentemente, não se traduzem em medidas concretas em nível nacional", avalia Pinheiro no estudo, o primeiro abrangente e global desenvolvido pelas Nações Unidas sobre todas as formas de violência contra crianças."
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